Leeuwarden - Wieringerwaard

Tínhamos os lagos só para nós. Todo aquele enorme parque estava silencioso e quieto. Apenas os patos se faziam ouvir por vezes. O lago ao nosso lado parecia um espelho com a fraca neblina e o nascer do sol a começar. Foi um belo começar de dia.


Leeuwarden não ficava muito longe do parque onde dormíramos. Talvez por isso, as ruas ainda estivessem a despertar enquanto procurávamos uma delas em específico. Não foi difícil. Estamos na Holanda, esta era uma cidade média/grande, logo uns mapas espalhados, encaminham o turista incauto na direcção certa. Apenas procurávamos uma pequena ruela, junto aos canais e uma chamada kaanalstrad. Foi aqui um Erasmus de uma certa irmã estudante, há anos atrás. Nunca pensáramos que por aqui íamos passar quando saímos de Portugal há um ano atrás. São com os acasos e os desvios que a vida vai traçando, que nos trouxeram aqui.


Pela ciclovia, continuamos a nossa viagem para oeste. Chegaríamos a um obstáculo da natureza hoje, que nos levaria a mudar de rota para o sul. Mas antes da natureza, tínhamos que ultrapassar os obstáculos do homem. Umas obras num edifico de vidro, colocaram o guindaste no meio da ciclovia, sem termos forma de o contornar. Demos a volta e encontrámos outra ciclovia que seguia na mesma direcção. Tínhamos era que encontrar uma forma de voltar à ciclovia certa, que ficava do outro lado da auto-estrada. Uma passagem elevada mais à frente... Normalmente, nem sequer ponderamos estas alternativas. Degraus íngremes, tirar malas e carregar tudo às prestações para o outro lado. Mas estamos na Holanda. Os degraus não são tão íngremes e ao lado está um corredor sem degraus onde podemos empurrar as bicicletas.

Sem chuva a ameaçar, a paisagem rolava com as planícies, os moinhos, os canais, o cultivo, as vacas e as ovelhas. Estas últimas desde a Alemanha que são diferentes das que vimos até agora. Mais peladas e rijas, parecem. E não respondem às nossas tentativas de conversas!

A seguir ao almoço, ao sair da cidade, pedalando junto a um dique, o cheiro e o som finalmente fizeram-se ouvir. O mar!
Não consegui aguentar! Tive que largar a bicicleta, subir o dique e olhar para ele. A última vez que o vira foi num dia chuvoso da Turquia, à três mil quilómetros atrás. Como não podíamos continuar para Oeste, virámos para Sul, e passado pouco tempo, começámos a pedalar algo de novo para nós. Pedalámos sobre o mar, ao longo do agora extinto Mar do Sul.
São trinta quilómetros de dique, construídos há muito tempo.

A meio do dique, uma chuvada apanhou-nos. Mas já estávamos impermeabilizados! Ou quase. Os impermeáveis da marca que começa por Q já começam a mostrar fraqueza e ao fim de muita água, aquilo mete água. Ou não estivéssemos nós no meio do mar!


A Janny mandáva-nos mensagens de coragem. A chuva veio, e um solinho fraquinho e um ventinho mediozinho secaram a nossa roupa. Rolámos contentes, com o cheiro a mar, as ovelhas maciças a mastigar sem parar no meio do mar.

Numa possível perda de orientação, um senhor de tamancas e fato de agricultor ajudou-nos. Falou, falou muito. E para quem não entendeu uma palavra de holandês, percebemos tudo o que disse sem termos percebido nada. Foi de ir às lágrimas a rir, quando o Alexandre disse: "percebi tudo!", "acho que ele disse que este caminho antes era mais fácil, mas agora com as obras ficou mais longo". "Ele queria que nós seguíssemos por outro caminho mais curto, mas quando viu o mapa, achou muito complicado para explicar!" É claro que tive que rir! Não entendemos uma única palavra, à excepção dos acenos de cabeça, e ele sai-se com isto tudo. E a verdade é que fazia todo o sentido, pelo contexto, e maneira de falar! Já estamos tão receptivos a línguas novas que depois acontece-nos isto!!!!!

À entrada da cidade, enviámos uma nova mensagem à Janny, que respondeu com a morada e mais indicações. Não ia lá estar mas o vizinho ia abrir-nos a porta.
O vizinho viu-nos e veio de lá com a chave. Abriu a porta pôs-nos à vontade e voltou aos seus afazeres!
E nós? Sozinhos, numa antiga estação de caminhos de ferro! Tínhamos um recado a receber-nos em cima da mesa! Podíamos comer, e levar as coisas para o nosso quarto no último andar. Nem sabíamos por onde começar, com tanta coisa ao mesmo tempo.
Comemos uma pasta rápida e explorámos depois. A casa era enorme e linda! O último andar parecia bom demais para ser verdade. Um andar inteiro para o quarto e a casa de banho sem nenhuma parede a dividir. Apenas um pequeno muro a delimitar. Montes de janelas, rede mosquiteira, plantas, armários e tudo a cheirar a novo! Uau! Bom demais para ser tudo para nós.


Até às onze ficámos a aguentar-nos de sono, na cozinha para receber os nossos anfitriões. Que ironia, nós os recebermos a eles!
Chegaram e partilhámos um chá e meia dúzia de palavras!
Fomos dormir a sentir que queríamos ter estado mais tempo com eles, antes de dormir. Afinal, eles chegaram e nós já nos tínhamos instalado! E pelo pouco que conversámos, são viajantes de bicicletas de longa distância... Isto promete!


...há um ano atrás: Nazaré - Fátima

1 comentário:

Nuno Vieira disse...

Mais uma vez alguém está de parabéns, a primeira foto (no Flickr) está lindíssima: poética, bucólica, nostálgica, introspectiva. O banco que contempla sozinho o horizonte é o toque de Midas.