Vendas Novas - Viana do Alentejo

Dormimos tão bem quanto se podia esperar, por dormir dentro de quatro paredes. Às oito saímos do quarto, despedimo-nos dos bombeiros e montámos nas bicicletas, para mais um dia de viagem. Este, avizinhava-se cinzento.


Chegámos a Montemor-o-Novo e depois de um prolongado pequeno-almoço, regressámos à nossa amiga nacional dois, que nestas bandas ainda não foi promovida e mantém-se, regional.
Algures, numa vida atrás, atravessámos esta mesma serra, a Serra de Monfurado, de Verão mas fresquinhos no que toca a fazer viagens de bicicleta. Sempre nas mudanças mais baixas, sempre a suor por todos os poros e se bem me lembro, de vez em quando lá tinha que ser de empurrão.
Hoje, temos um dia de Inverno em Portugal. Cinzento, com chuva molha parvos e um frio de fim de Verão, mais do que de início de Inverno. As mudanças desta vez mantiveram-se acima, o suor nem chegou a vir. Mas a paisagem não mudou, apesar de agora não estar tão seca. Nem a sensação de vitória e bem estar quando damos conta que chegámos ao topo e temos à nossa frente a imensidão do Alentejo. Um olhar abarcava o vale de vinte quilómetros que nos separava de Alcáçovas.

Ao entrar em Alcáçovas, decidimos repousar e aproveitar a aberta na chuva, para enfiar algum combustível cá para dentro. Foi enquanto estávamos sentados na Praça da República, que começamos a olhar ao nosso redor e a reparar nos detalhes. Por estas bandas, as cores predominantes das casa são o branco com azul a rodear portas janelas e nos rodapés. Já não me lembrava que no Alentejo as cores são assim, e tão pouco me lembrei delas quando as vi num outro local, bem longe daqui e sob um céu mais soalheiro. O estilo das Ilhas Cíclades, nas construções das ilhas gregas. Pelos vistos o sol, a modos que "forçou" a arquitectura e as cores mais adequadas. Independentemente se as pessoas são gregas ou portuguesas. O estilo cíclades no Alentejo, ou o alentejano do Mediterrâneo?


Nós já raramente metemos conversa com os nativos, preferindo mais a paz e sossego nos nossos dias. Como David, o hospitaleiro de Tosantos. Ainda assim, uma senhora veio ter connosco com sinalética gestual a constatar que estávamos a comer. Quando lhe dissemos que: "...somos portugueses..." e "...viemos de Vendas Novas hoje e vamos para Tavira...", pareceu-nos a nós que a senhora perdeu o interesse. Como se por sermos portugueses a viajar de bicicleta, já não fossemos "interessantes". Será, que a interpretámos bem?
Não seria a última, hoje, a tomar-nos por estrangeiros.
Em Viana do Alentejo, enquanto a Ana foi ao Minipreço, um senhor de cabelo comprido grisalho, na casa dos quarenta e muitos, óculos e com ar de professor universitário, veio ter comigo e começou: "Do you speak English?". Á cabeça, só me vieram respostas de "Sou português!", "Falo português!" ou "Não sou inglês!" (sinónimo de estrangeiro)". Mas o tom não seria o correcto e não queria ofende-lo. Entrei no jogo.
"Yes, I speak English! Are you Portuguese?, ao que ele responde com um sorriso, "Yes, I am!". "Good! So am I!", retribuo. A risota esperada veio logo a seguir. A conversa ainda resistiu mais do que um minuto.
Viana do Alentejo está a tornar-se num dormitório de Évora... Alvito é mais bonito... A ponte para Vidigueira está em obras... Por aí... Mas ao despedir-se, fiquei de novo com a impressão de que se fosse de facto um estrangeiro a viajar de bicicleta em Portugal, muitos mais frutos teriam advindo da conversa.

Porque nos tomarão sempre por alemães, ingleses ou de outro qualquer país? Porque não pode um português a viajar de bicicleta, na sua própria terra, ser uma visão mais normal e acalentada pelos nossos?

Já nos Bombeiros Voluntários de Viana do Alentejo, a hospitalidade do costume, não nos deixou ficar mal. Sempre com boa disposição lá nos indicaram o quarto onde podíamos dormir e até nos facilitaram a chave do mesmo, caso quiséssemos ir ar um volta, mais descansados!

Ao adormecer, um zumbido artificial inundava o quarto no silêncio da noite...



...há um ano atrás: Gonfaron

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