Gela - Modica

O dia apesar de cinzentão estava seco. Seco se pensarmos de cima para baixo, das nuvens para a terra, porque de baixo para cima, das bermas das estradas para nós, não. Foi só sair de Gela e entrar na estreita estrada 115, que nos acompanha desde a nossa chegada a Trapani, que o seco se tornou relativo. As bicicletas limpas, estavam em menos de nada todas cobertas de lama, assim como os nossos sacos e a nossa roupa.
Levámos irritados com as habituais e chatas buzinadelas, que os sicilianos não conseguem conter nos seus carros. Porque querem avisar-nos da sua presença (como se um carro conseguisse passar despercebido), ou porque querem saudar-nos, ou então porque já é tique e buzinam num descontrolo. Dizem que há sítios bem piores.
Um camião em sentido contrário viu-nos ao longe e tal como nós percebeu o que ía acontecer. Encolhemo-nos e esperámos pelo inevitável, mesmo com o camionista a abrandar, levámos com uma onda gigante de água e lama que nos molhou e sujou ainda mais da cabeça aos pneus. É assim a vida dos Nomadiclas.
O almoço já vinha preparado da casa do Ludo. Com as nuvens cinzentas em cima de nós, não perdemos muito tempo a comer.
Cansámo-nos a subir durante 10km sem parar, até ao topo, de quase 0 metros aos 650 metros. A vista sobre a cidade animáva-nos.
Em Ragusa o relógio dizia que não teríamos tempo para contemplar esta bela cidade e percorrer os restantes 20km que faltavam antes de anoitecer.
Continuámos e chegámos de noite. A cidade dividia-se em Módica alta e baixa e o Vincenzo vivia mesmo no meio. Junto à famosa igreja de São Jorge. Até lá chegar, fomos descendo ruinhas cheias de igrejas, cheias de estátuas. Para onde quer que olhássemos tudo era bonito. Em plena parte histórica a beleza entrava-nos pelos olhos, sem deixar tempo para descansar. Achas que isto é bonito? Então toma lá mais isto. É assim a vida dos Nomadiclas.
O Enzo Puma esperáva-nos na escadaria da igreja. E depois de descer tudo, subimos um bocadinho pelas ruinhas íngremes a empurrar as bicicletas até à sua porta. As bicicletas na porta mais à direita, ao lado dos muitos cavalos do motão para os passeios do Enzo. As malas na casa da esquerda. E nós na porta do meio para conhecer a casa do Enzo.
Saímos para fazer um giro pela cidade. Comprar o jantar de pizza, arancinas, folhados de muitos sabores. Custou aguentar até ao jantar com a imagem rechonchuda destes petiscos a passear na cabeça. Comprar pão e queijo, saborear o queijo com que nos regalam, e logo na porta ao lado experimentar a granita de café que a amiga do Vincenzo faz sempre que ele lhe traz os amigos do couchsurfing.
Visitar a mãe do Enzo que nos promete almôndegas com pasta para o dia seguinte e voltar a casa para o manjar.
Em conversa com o Enzo apercebemo-nos de como somos pequeninos. Conta-nos as histórias de dezenas de pessoas que já passaram pela sua casa, nos 4 anos em que faz Cochsurfing. Sozinhos, de bicicleta, a pé pela Europa, à boleia, um mar de gente corajosa e aventureira. Somos apenas mais um casal que se junta a tantos outros. Mas mesmo assim o Vincenzo que segue a sua filosofia de quando não pode ir ver o Mundo, traz o Mundo até à sua casa, acolheu-nos e fez-nos sentir especiais com as histórias que partilhava.
O cansaço e o banho prometido e necessário fazem as despedidas até ao dia seguinte.

Sem comentários: