Megali Matiniea

Sem pensar muito no assunto, fomos ficando em casa da Dianne. Sentíamo-nos bem, e não tínhamos ninguém à nossa espera. Ficámos com ela 3 noites.

Todas as manhãs assim que acordávamos ouvíamos as abelhas. Apesar de terem as casas uns patamares abaixo, vinham aqui pelas flores e pela água. Pousavam sobretudo no pequeno charco do peixinho solitário e ali ficavam a beber e a esvoaçar de flor em flor. O seu zumbido era inconfundível e por serem tantas, bastante audível.


Tomávamos uns pequenos almoços relaxados no jardim, com compotas e doces caseiros, chá inglês e torradas. A gata Lemoni juntava-se a nós. As suas conversas miadas eram constantes e muito perceptíveis (dentro dos possíveis) - comida e festas. de vez em quando tentava afiar as unhas nos nossos pneus...

A Dianne intercalava o seu trabalho na horta. Trabalhava e descansava e ia fazendo o que havia para ser feito. Mesmo assim, há muito trabalho em que precisa de ajuda. Ficou entusiasmada quando lhe contámos do HelpX e inscreveu-se enquanto lá estávamos. Parecia a solução ideal para todos os seus problemas.

A meio da tarde, o amigo Ernest apareceu e trouxe com ele mais dois amigos, também austríacos. Ao todos éramos cinco em redor da mesa a beber rosé e a conversar. O Ernest tem uma espécie de acordo com o Lidl de Kalamata.Vai todos os dias buscar o que está no fim de validade, não é apresentável para venda ao público, já passou do prazo e por aí. Falou-lhes (ao Lidl) do seus animais e quinta onde faz compostagem e eles aceitaram dar-lhe o que sobrasse, com a condição de levar Tudo o que fosse para deitar fora. Negócio feito! Agora o Ernest distribui sumos, fiambre, laranjas, areia para gato, bisoitos, arroz, entre outros, para pelos seus amigose pela sua quinta. Nesta zona da Grécia, há muitos foragidos de outros países, ingleses, alemães, austríacos... A maior parte dos estrangeiros conhece-se entre si e alguns desenvolveram uma fraternidade em que cada um partilha com os outros o que semeia/colhe. Ninguém semeia/planta fruta/legumes repetidos. Variedade não falta.

No meio da conversa o Ernest mexeu-se na antiga cadeira de madeira e despoletou uma série de acrobacias em que foi descendo aos bocadinhos até cair para trás e rebolar no chão, para espanto de todos nós que assistíamos à cena. A cadeira ficou desfeita em bocados. Ninguém se magoou e no final a risota, claro!

Na segunda noite, depois da paparoca nocturna, assistimos ao Capitão Coreli. Para nós dois uma estreia, para a Dianne nem por isso. Não fosse a gata ter o nome de uma das personagens...Foi interessante, depois de tanto tempo a querer ver este filme, vê-lo aqui na Grécia, onde foi filmado e ver no ecrã os personagens nos mesmos sítios de Kefalonia onde tínhamos estado há tão pouco tempo: "Eehhh....Nós acampámos ali!"

Sábado dia de mercado, toda a gente sai à rua. Entre bancas de ervas do campo, que aqui são tratadas como outra hortaliça qualquer, morangos que começam a ficar mais baratos, mais fruta e verdura, lá comprámos também as nossas. Mais umas douradas para o jantar.


No final da tarde antes do sol se pôr descemos até aos cafés/restaurantes perto do mar. Os barquinhos mais pequenos do avesso, os maiores suspensos em cima de traves e estruturas de suporte. O cheiro a tinta no ar e todos os pescadores de lata de tinta em punho a pintar o casco, a escrever o nome, a tirar a fita adesiva.
As esplanadas semi cheias com grupos a comer e beber, a conversar animadamente ao sabor da brisa e calor do sol. O aroma a peixe frito, gargalhadas, conversas em alto som, em grego e noutras línguas. Encontrámos uma amiga alemã e um amigo inglês. A amiga alemã falava português e nenhum de nós se lembra do nome dela. Trabalhou três anos na Amazónia como enfermeira, por isso o seu sotaque era brasileiro. Ficou muito contente por desenferrujara a língua que tanto gosta e não quer esquecer.
O Peter era inglês e era um artista: tocava guitarra, velejava, e tentava ganhar a vida com a fotografia. Velejou pelo litoral português e sabia bem do que falava. Lembrava-se das minis, das tostas mistas, da Madeira ser linda e cheia de flores, do português escutado pela primeira vez rádio e soar a russo. A nós é que nos soube bem falar de casa com alguém que tinha tão presente o que tinha lá vivido.
O Ernest e os amigos também por lá apareceram depois, numa mesa diferente e, desta vez, sem partir cadeiras.

A harmonia reinava entre nós, o rosé, a cerveja, o vinho branco, muitas câmaras fotográficas, o pôr do sol, o som da água e a sua transparência e nós a desfrutar disto tudo ora em silêncio contemplativo, ou com pequenas conversas em várias línguas. Um sorriso feliz no rosto...

Subimos até casa depois do sol se pôr e começámos a preparar o jantar com o que comprámos no mercado. Por cima do lava loiça um escorpião levantou dúvidas. A  Ana pensava que era um brinquedo e por pouco não lhe tocou. Organizámo-nos numa operação delicada de captura e libertação do escorpião e continuámos. O serão foi calmo ao sabor de fotos de família e pálpebras a lutarem para ficar abertas.

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