Macomer - Tramatza

Pois é... as collants da Calzedonia são empacotadas aqui! Há sempre alguém a tocar à campainha a todas as horas do dia para entregar mais collants para eles confirmarem, fecharem as caixas e irem distribuí-las às lojas. A Tonina ainda quis oferecer umas à Ana, mas não é coisa que utilizemos nesta viagem.
Foi uma despedida emocionante. Deixámos para trás uns anfitriões que mais sentimos como família, e a mãe Tonina a enxugar as lágrimas.
Já tínhamos o caminho mais que planeado e revisto no dia anterior. O Cosimo tinha medo de uma subida. Sem stress, a inclinação era fraca e foram só 10km. Depois num ápice fizemos os 30km a descer e antes e almoço estávamos em casa do Frederico.
Só que ele não se chamava Frederico... Segundo as indicações que ele nos tinha dado, estávamos no lugar certo. Mas quisemos confirmar e  atravessámos a rua para perguntar aos vizinhos que estavam no café. Fomos alvos de todas as atenções assim que entrámos na praça. Por isso à medida que nos aproximámos as expressões de contentamento de ver satisfeitas a curiosidade encheram a cara dos signores sentados na esplanada do café. Numa questão de segundos, estavam 4 pessoas a discutir em italiano quem era o Frederico. Todos os Fredericos vieram à baila, iam-se virando para mim para ver se tinham acertado. Eu ia participando, dizendo que ele era estudante, que era português, que estava em Oriano, mais isto e aquilo. No final, atravessei a estrada numa linha recta e só parei quando toquei à campainha. Atrás de mim sabia que todos aguardavam para ver quem apareceria à porta.
Apareceu uma senhora, que os dois pensámos, de imediato, tratar-se da senhoria da casa. Convidou-nos a entrar.
Na parede um dos quadros dizia Federico Maio de 1992. Mas afinal quantos anos tinha ele? Depois de esperar uns curtos mas eternos minutos é que desfizemos todas as dúvidas quando a Victoria e o Féderico nos explicaram tudo. Ele não era português, mas tinha feito uma ano de Erasmus em Portugal e por isso falava português muitíssimo bem. Às vezes saíam-lhe uns "bués", uns "muita fixe" e uns inúmeros " tás a ver". Houve uma vez que até disse "...., pá!"
Morava com os pais, novamente, depois de ter estado fora muito tempo. A começar em Janeiro, vai ter umas férias de 6 meses, com as quais planeia viajar.
A mãe dele entrou em modo automático de mãe. A casa estava suja, desarrumada e não tinha nada preparado para o almoço. E ela não parava de o dizer ao Féderico. Nós ficámos um bocado constrangidos porque não tínhamos planeado ser tão rápidos a chegar e sabíamos que não nos esperavam para almoçar. A casa estava mais que limpa e arrumada e não pudemos deixar de sentir e pensar que as mães em qualquer parte do mundo são todas iguais.
O almoço estava  maravilhoso. Mesmo sendo improvisado foi das pastas mais saborosas que comemos. Muitos espargos, nham, nham... com o aviso de que quando evacuássemos sentiríamos de imediato o poder dos espargos selvagens.
A seguir ao almoço saímos para dar uma volta nas redondezas. O Féderico levou-nos até à costa e passeámos junto ao mar. A presença daquele tipo específico de algas indicava que a água era limpa. Mas mesmo sem algas, o cheiro forte a maresia e a transparência da água mostravam-nos o quão precioso este sítio era. Bebemos a nossa primeira cerveja sarda, uma Icnusa para cada um. E um brinde aos novos amigos que se formaram.
Andavam por ali pescadores de polvos e outros tantos na labuta diária.
A apanha de ouriços do mar está a deixá-los em extinção também nesta zona, depois de já terem deixado a zona sul da Sardenha por já os terem extinguido aí. As famílias vivem desta apanha e não se pensa a longo prazo.
Quando regressámos a casa já a mãe do Féderico tinha arrumado tudo e limpo tudo.  Apenas olhos clínicos o poderiam notar.
A mãe Victoria mostrou-nos com orgulho os quadros de pão trabalhado que a sua mãe tinha feito. Verdadeiras obras de arte cheias de minúcia e que já ofereceram ao Papa e ao príncipe do Mónaco. Entusiasmada continuou a mostrar-nos a sua colecção de pedras. Se há um estereótipo de mulher italiana típica, a mãe do Féderico preenchia os requisitos de fala. Falava muito, com muita força, sempre cheia de entusiasmo e ria a acompanhar.
Jantámos delícias típicas mais uma vez, com ênfase na pancheta (barriga de porco) e na bottarga (ovas de peixe secas), tudo regado com vinho caseiro. Houve alguma discussão quando falámos nas ovas de polvo secas, típicas do sul de Portugal, que por serem pescadores de polvo, nunca tinham visto e por isso insistiam que não existiam. A Internet chega e desfaz as dúvidas.
E é verdade, quando vamos à casa de banho depois de ter comido espargos selvagens, cheira mesmo muito a espargos.

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