Mara - Tyachiv

As árvores altas sempre ajudaram a passar a noite protegidos do vento e da chuva forte que se fizeram sentir pela noite dentro.


Os ciclistas do dia anterior estavam certos e faltavam cinco quilómetros para o topo. O que só vem reforçar a nossa teoria de quem sente os quilómetros a passar no corpinho tem muito mais noção de distâncias. São normalmente, os ciclistas a dar-nos as indicações mais precisas em termos de inclinações e distâncias.

Quando começámos a descer, as casas e construções, em redor, eram todas de madeira. Cheirava a madeira acabada de cortar, uma cascata das alturas jorrava água e muitos pormenores trabalhados na madeira ocupavam por completo os nossos sentidos.


Ao paramos para comer um snack, um rapaz de bicicleta, não disfarçou a sua alegria ao ver-nos. Ficou radiante diante de nós a observar tudo, com um ar curioso. Tentou falar connosco. Percebemos que nos perguntava onde poderia arranjar uma bicicleta como as nossas. Queríamos dar-lhe alguma coisa. O seu entusiasmo era puro. Deu uma volta numa das bicicletas e depois do adeus continuou a olhar para nós de boca aberta.

Antes de sair do país parámos para o almoço e para nos escondermos do sol. Estava muito calor e não nos sentimos bem a secar e pedalar debaixo da torreira de um dia de calor como este. Parámos e vemos logo dois ciclistas de bicicletas cheias de malas. Trocámos meia dúzia de palavras. Eram da República Checa e apanharam um autocarro até aqui para pedalarem durante as férias até casa.

Eu fui às compras e o Alexandre ficou com as biclas. No supermercado, mais uma vez chamei a atenção e tive o segurança atrás de mim, até lhe falar em inglês e ele perceber que eu não era uma cigana! E já vão duas!
Lá fora, assim que cheguei o Alexandre sorria a contar-me de outros dois franceses de bicicleta que andavam a viajar como nós. Tinham os cabelos e barba todos louros de andar ao sol. Almoçaram ao sol e sairam para pedalar debaixo dele. A conversa foi mais demorada. Eram de Grounoble, como o Tom e a Pauline que encontrámos em Sicília, e o Nicholas que encontrámos na Turquia! E como estes, também tinham planeado dar a volta ao Mediterrâneo! As complicações na Síria alteraram os primeiros planos, e acabavam agora de dar a volta ao Mar Negro.


A fronteira! Vínhamos com a cabeça cheia de historinhas.
Na realidade sentimos alguma tensão ao aproximarmo-nos e só respirámos de alívio alguns quilómetros depois.
A fila a pé e de bicicleta, era composta por nós e pelos romenos.
Cada um que chegava, tirava a carteira punha uma nota no meio do passaporte, e punha-se na fila. Alguns iam directos à janelinha e enfiavam logo ali o passaporte à mistura com uma conversa cheia de sorrisos e boa disposição! Vimos sacos de pêssegos a passar e lá dentro ao lado da secretária uma caixa onde os guardas punham todos os "extras" ganhos no seu trabalho. E nós ali no meio, com um sinal a proibir subornos mesmo a centímetros das nossas caras. Eu a ler bribing em voz alta e o Alexandre a acotovelar-me para estar calada. Agora já sei o que quer dizer, mas não sabia na altura.
Passámos, mas enquanto os nossos passaportes foram revistados, de forma minuciosa, não conseguimos evitar o nervoso miudinho.

Logo ali à frente estava a nossa primeira vila. Sem dinheiro da Ucrânia e sem comida entrámos no banco para resolver este pequeno problema. Palavras, inglês, ucrâniano, mais alto, mais devagar, gestos. Sorrisos e......... dentes de ouro. As três primeiras pessoas com quem falámos incluindo o senhor do banco tinham dentes de ouro!
O banqueiro de sorriso branco e dourado fechou as portas e foi connosco até ao multibanco. Ahhh...

Entrámos logo no supermercado. Água! Água com gás, água com gás de sabor a limão, água com gás de sabor a maçã, água com gás pequena, água com gás de dois litros. Água sem gás. Ahhh! e foi buscar lá dentro uma garrafa. Que, de facto, sabia a água com gás, mas sem gás. Comprámos comida para o jantar sempre a comparar preços e afazer contas. É mais barato! É mais caro!

O senhor do banco apareceu de novo. Terminara o seu trabalho, e juntava-se a muitos outros numa cerveja na esplanada. Ajudou-nos com o caminho num esboço da estrada e acenou-nos adeus quando partimos.

Pela estrada fora com o rio à esquerda e plantações dos dois lados, começámos à procura de um sítio para passar a noite. Plano, sem estar ensopado, escondido da estrada. Só pedimos isto . E mais à frente dois ciclistas com bagagem! Uau! Mais dois!


Eram de Praga. Chamavam-se os dois João e eram muito simpáticos.Um deles era guia turístico e falava nove língas. O João. Falou-nos em português e tudo! Estavam de férias e convidaram-nos para as suas casas se, por acaso, fossemos por lá passar .

Poucos metros depois da despedida aos checos, já estávamos nós a empurrar as bicicletas para o meio das plantações. Ficámos entre a estrada e o comboio. Um senhor passou por lá mas reagiu como se fizessemos a coisa mais natural do mundo. O nosso primeiro dia na Ucrânia.

1 comentário:

Nuno Vieira disse...

Dentes de ouro, que maravilhoso... Estava a pensar colocar alguns (talvez os dois incisivos)e, como sou incrivelmente original, um braço de PVC. Ah, é verdade, e uma pena de madeira...