Dripchevo - Nova Zagora

Ainda não é Verão, mas às 7 da matina, já não se pode estar na tenda. Não interessa se é um campismo bonito.

Na primeira vila que encontramos, procuramos uma loja de conveniência. Aqui, todos olham para nós boquiabertos, como se tivéssemos acabados de aterrar. Entramos na loja, que pelos vistos vende de tudo. Doces, gulodices salgados, carne, congelados, gelados, pão, alguma indumentária e tupperwares.
Enquanto comíamos o nosso pão, sentados num degrau da loja, um senhor ao lado numa mesa, começa a falar connosco. Em búlgaro não percebíamos patavina, mas pelos gestos percebemos que nos estava a convidar  para nos sentarmos à mesa com ele. Não é preciso, obrigado, respondemos nós. Momentos depois, aparecem-nos dois cafés nas mãos, cortesia do senhor, que achou pouco e por isso foi ao carro tirar das suas compras, pepinos e iogurtes! Não estamos na Turquia, as diferenças saltam à vista, mas a hospitalidade é a mesma.


Assim como as paisagens de perder de vista. Ainda estamos a pedalar uma serrazita, mas o horizonte já se mede em dezenas de quilómetros. Plantações, florestas a intercalar, mais colinas e mais planícies. Imensas plantações de alfazema enchem os nossos narizes.
Avisaram-nos das estradas da Bulgária. Sem bermas! Com buracos! Sim, lá que não tem bermas é verdade, mas os buracos são tantos como em qualquer estrada pedalada anteriormente.
Os suficientes para poder pedalar a olhar mais para o céu do que para a estrada. Estamos nas planícies de Zagora, o trânsito é pouco e as curvas também. Não há pressas. O calor acalmou, a estrada é fácil.
Entre os muitos animais mortos que encontramos na estrada, vamos descobrindo que segredos se escondem nas margens e arbustos que se abeiram da estrada. É triste porque o vemos morto, mas ao mesmo tempo, enche-nos de esperança, porque de onde veio aquele imaginamos que existam muitos mais.
Hoje vimos um texugo pela primeira vez! Enorme, como um cão grande, deitado de lado com a língua de fora. Não nos demorámos nesta mórbida visão, e ao olhar em frente ambos vimos uma doninha a atravessar a estrada a correr ea esconder-se entre os arbustos da outra margem e a desaparecer.


Quando chegámos a Nova Zagora, armados com a morada e excesso de confiança, lá fomos nós à procura da casa do Hristo.
As ruas não tinham nome e quando tinham era em cirílico. oops! Vamos perguntar a este senhor. Olha para nós como nós para ele: chinês! Tentemos outro. Este abana a cabeça, aponta para ali, vai perguntar ao outro e lá nos guia até à rua.
Ok, se é esta a rua, só nos falta encontrar o numero da porta. Pedalamos, pedalamos e nada. A rua parece terminar numa floresta na parte abandonada da cidade. Tentemos os nativos de novo. Os próximos arranham o inglês, mas têm que fazer um esforço mental abominável para abanar a cabeça de cima para baixo. Aqui o sim e o não estão trocados e se isso já é confusão para os forasteiros, imaginem quando os búlgaros tentam ajudar e fazem ao contrário, que é o nosso normal. Afinal disse sim ou não!!?! Vá-se lá perceber!

...30 minutos depois de voltas e mais voltas, lá encontrámos a casa do Hristo. Admirou-se de termos demorado tanto!
Trouxémos-lhe a encomenda que ele nos pediu anteriormente. Uma garrafa de dois litros e meio de cerveja búlgara. Neste lado da Europa, não existem tantas restrições sanitárias, por isso as garrafas de plástico ainda são rotina do dia a dia.
O Hristo é um empresário. Tem uma fábrica de produtos lácteos e fabrica tudo que deles provém. Queijos, leites, iogurtes e gelados. Estes últimos não dão assim tanto lucro num país com dois a três meses de Verão, por isso vai mudar-se para o Egito, onde a mão-de-obra barata e os nove meses de calor, prometem aumentar os lucros!
Tal como todos os que vimos até agora, Hristo não é excepção e mantém uma horta na sua casa. Tudo o que é terreno e espaço é aproveitado para fazer crescer alguma coisa. Tomates, uvas, verduras e ervas aromáticas que são postas na mesa. Destas últimas, uma que nunca vimos antes e não conseguimos apanhar o nome, é usada para tudo o que foi posto na mesa. Desde os enchidos ao queijo, as rodelas de tomate e as fatias de pepino. Foram todas molhar o bico à misteriosa especiaria verde. Foi buscar-nos a planta para ver se conhecíamos mas ficámos na mesma!


À mesa nos sentámos quando chegámos, e nela ficámos pela noite dentro. Entretanto, a sua mulher e filha chegaram e juntaram-se a nós. Outras iguarias foram postas na mesa, mais enchidos, mais verduras, mais salgadinhos. Tudo muito informal e regado com a cerveja. Acabaram-se as terras mediterrânicas onde o vinho é o rei. Chega de  dezenas de chá por dia! Aqui começa a nossa aventura com a cevada!
Com o Hristo aprendemos que as origens do povo búlgaro provêm de épocas tão remotas como as invasões dos mongóis. Que foram os búlgaros a inventar o cirílico, que o povo russo adoptou como seu, e que é na Bulgária e apenas nela, que se trocam os gestos do sim e não. Algo que não percebemos totalmente, mas que se deve à época em que esta zona foi ocupada pelo império otomano.

E com eles aprendemos também que as montanhas que pretendemos atravessar, são moradia de serpentes, lobos e alguns ursos! Vamos lá dormir então e descansar para a selva que se avizinha.

1 comentário:

Nuno Vieira disse...

Lindíssimos, os campos de alfazema.