Dalyan – Guzelyali

Assim que saímos do esconderijo, não tivemos que pedalar muito até um ciclista turco, com espelho retrovisor no capacete metesse conversa. “Venham, venham! Gostaria de vos oferecer um pequeno-almoço” Olhámos um para o outro... porque não?
Seguimo-lo e estacionámos as burras junto a umas mesas no exterior daquilo que parecia uma loja de azeite e produtos da região. Os amigos deste já ia avançados na alimentação matinal. Nós entre conversas gestuais, palavras comuns, mapas e rotas delineadas e apresentadas, la fomos aceitando um queijinho, uns pasteis de batata e o omnipresente chá!
Ora estamos a pedalar em estraditas de campo, ora estamos a ter uma visita guiada às instalações de uma fábrica de azeite regional que se exporta para Itália ou a fazer provas de azeitonas.


Não tínhamos avançado muito de manhã. Ligámos o turbo e demos no duro até o sol dizer basta. A primeira vila que apareceu foi onde parámos. Não pensamos muito nisto, mas instintivamente já estamos sempre em busca de uma torneira, mangueira ou fonte para poder cozinhar com conforto. De uma sombra, jardim, bancos ou muros onde o sol inclemente não nos atinja durante algumas horas. Mas aqui na Turquia, ficamos satisfeitos com as placas de fotografias photoshopadas de Tavuk Doners por um ou dois euros.

Nesta vila, o estabelecimento tinha uma mesa a servir de esplanada e uma pérgola onde as burras podiam ficar à sombra.
Talvez a população da vila não fosse muito grande, porque nas horas que por ali ficámos a descansar, todos foram abastecer-se de bolas de gelados de vários sabores. A avó que leva os netos para lhes oferecer um cone a cada um. Os adolescentes de motorizadas e calças sujas de terra que oferecem uns aos outros gelados. O senhor do tractor que deixa o motor ligado enquanto escolhe o sabor favorito antes de voltar à cabina e continuar a lavoura. Deve ser aqui que a vila molha o bico em sabores frescos.


Hora de voltar ao alcatrão... ou talvez não. Prestes a subir para as nossas montadas, eis que mais um cavaleiro de alforges aparece vindo na direcção contrária! Estacionou a montada junto às nossas, pedimos mais um chá e iniciamos a troca.
A troca é, talvez, dos melhores aspectos desta viagem. A troca de experiências. A troca de conversas e opiniões com  alguém que nunca vimos antes e provavelmente nunca voltaremos a ver. Mas é tanto em comum, aquilo que temos, que poderíamos ter crescido juntos na mesma cidade ou ter sido da mesma turma no infantário.
Nicolas Richaud, francês de 27 anos, largou o trabalho seguro e monótono em Munich, aprendeu aquilo que achou que tinha que aprender sobre viajar de bicicleta, comprou uma, criou um blogue e fez-se à estrada com o objectivo de dar a volta ao Mediterrâneo.
Assim como o Tom e a Pauline na Sicília, é o segundo francês que encontramos que se propõe a conhecer o nosso mar. Espanha, Marrocos, Argélia, Tunísia, Malta, Itália e Grécia já ninguém lhe tira. Segue-se toda a costa Turca, Síria, Israel, Jordânia, Egipto e os Balcãs.
Parece que todos os viajantes que encontramos vão na direcção contrária. Será que alguma vez partilharemos durante mais do que um dia a viagem com outro pedaleiro?


Fomos porque, porque é melhor ir do que ficar a pensar no que seria se tivéssemos ido. Fizemos um desvio de dez quilómetros para ir a Troia. Não sei o que esperávamos. Entradas grátis? Estradas livres de souvenirs? Enfim...
Os 7000 km foram feitos às portas da lendária cidade, barrada pelas camionetas de turistas.

Com a nossa anfitrião a cancelar o acolhimento devido ao volume de trabalho, restou-nos procurar um campismo em cidade de Verão. Mas antes que a noite caísse e de enveredarmos para mais uma noite em terreno lavrado, o dia reservava-nos mais uma surpresa
Entre casas e hotéis, campismos fechados e praias demasiado expostas, um som familiar chega aos nossos ouvidos... Português! Os primeiros portugueses desde que saímos da nossa terrinha! Metemos conversa, mas foi tão difícil. Depois de tanto tempo a falar e a ouvir outras línguas, algo de estranho aconteceu nos nossos cérebros. Apenas aceitam como familiar as nossas vozes. O português foi delegado para os cantos poeirentos da massa cinzenta.
Foi terrivelmente esquisito ouvir a nossa língua materna a sair deste grupo de Lisboetas/Alentejanos de Cascais.

Sem comentários: