Cabrejas del Pinar - Villalba de Duero

Talvez fosse a altitude. Estávamos a acampar a mais de mil metros. Talvez fosse a leve brisa gélida que as árvores, que escolhemos como cobertura, deixavam passar. Talvez fosse um riacho que corresse perto. Talvez fosse por estarmos no Outono, e já vai sendo hora de o frio aparecer. Talvez tudo isto ou nada. O que é certo é que fez um briol de morrer durante toda a noite. Ninguém dormiu a partir de uma certa hora. Não foi tão mau como da vez  em França, o ano passado, mas andou lá perto. A água dos cantis congelou. Os alforges e tenda estavam estaladiços do gelo que acumularam e as varetas da tenda tinham os pingos de água da condensação também transformados em estalactites geladas.


Quem é que consegue arrumar tendas e tralhas, com os dedos dormentes do frio, a doerem por todos os lados? Foi uma carga de trabalhos, é o que foi. Quando finalmente começámos a pedalar, às dez, vestidos a rigor, com luvas e dois pares de meias, até suspirámos de alivio quando começámos a subir o restante troço, que nos levaria ao ponto mais alto da serra.

É sábado. Em Espanha, é sinónimo de sossego na estrada. Em especial em zonas destas. Subimos até aos mil e duzentos, com a nacional só para nós. A seguir, não foi sempre a descer, mas as descidas davam balanço para as subidas, por isso o conta-quilómetros avançava rápido.
Tirando a íngreme subida, no Parque Natural do Desfiladeiro do Rio Lobos, que nos pareceu ser um rio seco, mas com bastantes hikers e btt'tistas, a percorrerem os seus trilhos demarcados, o resto do dia foi mais plano.


Sempre a pedalar, com o sol de frente. As serras a ficaram para trás, os campos lavrados de solo vermelho e laranjas a dominarem  paisagem. As pequenas colinas, com antigos castelos em ruínas. Muros perdidos nos campos a delimitarem um terreno passado. Os vilarejos desertos, mas cheios de carácter e perfeitamente adequados à paisagem. A segurança de encontrarmos sempre uma fonte de água fresca. Ainda mais quando descemos, de novo, em direcção ao Duero. É por aqui, que aparecem as primeiras vinhas, que supomos serem de denominação, Vinho do Douro (será que estou a dizer bem?)

Algo aconteceu esta tarde de pedaleio. Encaminhados e sem sequer parar, perdemos o fio à meada e quando demos por nós, a cara bronzeada, ficou ainda mais queimada, os lábios gretados do excesso de sol e vento de frente, e eram sete da tarde, quando entrámos em Arada del Duero. Uma cidade demasiado grande para a hora que nela entrámos.
Muito trânsito. Muitas indústrias e bairros sociais. Muitas construções nos arredores. Muita confusão para encontrar um sítio onde dormir. Algo que só fizemos, quando passámos as vilas a seguir, quando o campo voltou a ficar deserto e quando enredámos por umas vinhas e empurrámos as biclas pelas encostas arenosas acima, como estocada final de um longo dia.


Mas que silêncio, a noite promete não ser tão fria como a anterior. Tudo está bem... Estamos a dormir juntos às vinhas do Douro.


...há um ano atrás: - Burgos - Redecilla del Camino

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