Ostuni - first week

A primeira semana foi de adaptação. A todas as novas rotinas, à maneira de comer (e beber), aos horários, aos espaços...


O nosso quarto é pequeno, mas muito bonito e mais que suficiente! A nossa tenda é bem menor! Uma cama de casal e uma mesinha de cabeceira. O tecto abobadado é atravessado por vigas de madeira. A parede e o tecto são todos de pedra. Das mesmas pedras antigas com que se construiu a casa. Duas portas: uma para a casa de banho e outra de entrada/saída, compartilhada por uma sala de estar onde estão a televisão, dvd's, alguns livros e as bebidas espirituosas cá da casa.

Na segunda noite da nossa estadia, sucessivos ribombares de trovões e relâmpagos encheram os nossos sentidos. No nosso quarto, sem janelas, era possível sentir a luz dos relâmpagos, apenas pelo pequeno arco no topo da porta que não tinha pedra. Continuaram assim pela noite fora. Um espectáculo de luz e de som só possível pela mãe Natureza que deixou-nos sem router/internet no dia seguinte.

O vinho, como vem sendo habitual nesta viagem, nunca falta. Rega todas as refeições e mesmo antes de jantar partilhamos um jarro, para ambientar... para abrir o apetite. Acabamos a noite todos sonolentos, a sorrir, com os dentes meio lilases... Se há vinho no jarro os copos estão sempre cheios. Assim que há um copo vazio, segundos depois já está cheio outra vez.

A comida é, além de completamente deliciosa, na maioria, é vegetariana. O que no final das contas, é igual a uma alimentação mediterrânea. Carne e peixe sim senhor, mas com moderação. Comemos um curry de vegetais da horta, sopa, risotto de funcho e um puré de favas que sabem a verdadeira Itália, nesta casa de gentes inglesas.

Atrás da casa moram as 7 galinhas, dois galos, 2 fêmeas e um macho de uma espécie de ave que não descobrimos o nome, mas que fazem barulho à brava e por isso são bons animais de guarda, dizem eles e os italianos. A toda à volta há árvores, a maioria oliveiras, algumas amendoeiras, figueiras e nogueiras. O azeite é proveniente das suas quase 200 oliveiras, assim como as nozes, amêndoas e os figos. Ao lado têm o que se chama raised beds, uma espécie de canteiros elevados onde plantam e semeiam ervas aromáticas, e vegetais. Rúcula, brócolos, alface, couve lombarda, salva, salsa, coentros, alecrim, hortelã e morangos são alguns exemplos do que aqui consta e do que podemos encontrar no nosso prato. No mesmo espaço das galinhas está a compostagem. Papel, restos de comida, pequenos pedaços de tecidos, folhas secas, erva, ramos, de quase tudo se pode fazer composto. Só depende do tamanho com que para lá é posto.

No telhado estão os painéis solares que aquecem toda a casa e produzem mais energia do que a consumida. A diferença vende-se à companhia da electricidade. A lareira que aquece toda a casa é acesa ao entardecer e liga-se também ao aquecimento do chão.


Há um cão, o Muttie (palavra carinhosa para Rafeiro). Adora o jogo do atira e busca. Enquanto trabalhamos no exterior temo-lo sempre por perto a correr com a bola na boca, para nós atirarmos. Quando não acha a bola, vai buscar outra, quando perde todas as bolas, vai uma pedra, quando não acha uma pedra, vai um pedregulho. Depois é vê-lo a ganir sozinho porque é grande demais para pôr na boca ou porque se magoa a tentar fazê-lo. É assim o Muttie... só quer que a gente goste dele.
O Zenzero (palavra italiana para Gengibre) é malhado da cor do gengibre. Um jovem gato fascinado com TUDO o que o rodeia. Se o Muttie é incansável, o Zen não lhe fica atrás. Corre atrás de folhas levadas pelo vento, esconde-se e prepara ataques ao cão, a nós, às ervas e folhas. Tudo serve para brincar. Posiciona-se num sítio estratégico, escondido, e de repente é vê-lo correr veloz em direcção a.... nada. Sobe às àrvores, trepa pela rede mosquiteira da porta, empoleira-se nas grades das janelas, provoca o cão, até as galinhas tem direito a vê-lo de barriga para o ar quando passam, como que a dizer-lhes: Venham brincar comigo! Zen é um aventureiro destemido.
A Coco (como de Coco Channel) é uma princesa siamesa. Uma trela de pérolas combinaria na perfeição com a sua personalidade. Tolera a presença do Zen apenas quando lhe convém e é frequente entrarem em desacordo. Deleita-se em frente à lareira e por ali fica, horas a apanhar banhos de calor e festas que os humanos lhe oferecem. Um colo confortável também a faz pensar duas vezes.
Antes da hora de deitar todos os animais são convidados a sair e dirigir-se para as respectivas camas no exterior. Tempos houve em que os dois (Cathy e Keith), empurravam entre si a tarefa de expulsar a Coco para a rua. Tal era a bichana. Parece que está melhor, mais social, mais tolerante.

Com a manhã de sábado livre, fomos visitar o mercado semanal, cheio de legumes e fruta locais e da época, mais bancas e banquinhas de ovos frescos que são bons para beber, ou quatro dezenas de sacas cheias de leguminosas e frutos secos que fazem crescer água na boa. A chuva miúda não impediu a passeata pela zona mais antiga da cidade. Descobrimos ruas e ruelas. Portadas todas trabalhadas, recantos pitorescos, arcos e escadarias, varandas e entradas cheias de pormenores. O lixo num de saco plástico à porta, os vasos e vasinhos à porta a enfeitar. Meio por sorte até encontrámos o mestre artesão que trabalha com madeira das oliveiras e faz verdadeiras obras de arte que custam deixar na loja. Descobrimos porque é que Ostuni é chamada a cidade branca (Città Bianca) quando nesta no centro histórico todas as casa eram brancas.


No domingo fomos convidados a juntar-nos à "excursão" e ir até ao famoso Carnivale de uma povoação vizinha. Seguimos uns atrás dos outros. A fila para entrar na cidade começava cedo e tivemos de ficar algum tempo no trânsito, pagar um balúrdio para estacionar, receber um saco cheio de publicidade, com sal e açucar sob diferentes formas, andar uns três quilómetros, e depois sim, juntar-nos à festa!
As varandas dos prédios, que ladeavam as ruas por onde passava o desfile, cheias de gente. Papelinhos a voar, um senhor atrás de nós, com um versão maior de um martelo de apitar, insistiu todo o dia em apitar-nos ao ouvido. Gente mascarada, crianças vestidas de ursinho, a dormir no bercinho, grupos de amigo a dançar e a cantar no meio da rua, gente a percorrer a rua nos dois sentidos a querer ver o desfile sem ter que esperar que ele passe num sítio, toda a gente bem disposta.
O vento fez-se sentir todo o dia, a chuva míuda ía e vinha e toda a gente tinha casacões apertados até cima, gorros e carapuços na cabeça, como vem sendo hábito ver por toda a Itália em dias de frio.

Sem comentários: